De vez em quando apetece-me tecer umas desconsiderações sobre o cinema português.
O problema é que pensar no cinema português é um trabalho extremamente difícil: primeiro tenho que interiorizar um elaborado exercício de imaginação ao fazer de conta que existe cinema português. Depois, como se isso não bastasse, tenho que inevitavelmente falar do Manoel de Oliveira. Aliás, não devo andar muito longe da verdade se disser que só ele, deve ser responsável, pelo menos, por metade do cinema português. Isto se houvesse cinema português...
Eu não disse que era complicado?
Mas o Manoel de Oliveira é sem dúvida nenhuma um realizador sem igual. Toda a gente já sabe que eu até estou convencido que ele é o único realizador do mundo que dispensa a palavra “Acção!” quando começa a filmar. (E, ou muito me engano, ou à avaliar pelo tamanho das cenas dos seus filmes, ele também é bastante renitente em usar a palavra “Corta!”.)
E se pensarmos bem, todo o cinema português em geral dispensa a palavra “Acção!”.
Já se fizeram por cá todos os géneros de filme:
Temos comédias. Pelo menos eu desmancho-me a rir cada vez que vejo, em praticamente todos os filmes portugueses, todas aquelas interpretações teatrais. No fundo é mais ou menos a mesma coisas que ter o Shakespeare participar no Big Brother.
Temos drama. São sem dúvida nenhuma um drama os números de espectadores a ver cinema português. E ainda é mais dramática a percentagem de espectadores que os vão ver mas saem a meio.
Temos terror. Bem vistas as coisas toda a história do cinema português é um autêntico terror.
Temos suspense. Continua a haver um enorme suspense em se saber quando é que finalmente será feito um filme relevante e de gosto inquestionável em Portugal.
Agora filmes de acção é que nada! Até já se fizeram filmes sobre a guerra colonial em que foi um autêntico suplício para se conseguir ver alguém a disparar um tiro!
Imaginem:
Produtor: Você está a dizer-me que quer dinheiro para um filme de guerra e não vai morrer ninguém?
Realizador: Genial não é?
Produtor: Mas metade do filme é passado no meio do mato em Angola, com um bando de soldados armados até aos dentes e ninguém chega a carregar no gatilho?!
Realizador: Exactamente. Como deve saber a minha visão do cinema está num plano superior a isso. Digamos que é um filme mais sobre a guerra psicológica.
Produtor: Guerra psicológica??? Ó amigo, ou você mata pelo menos meia dúzia de pretos ou a única coisa que há aqui vai haver de psicológico é o dinheiro para o filme!!!