Adoro acampar. Fazer campismo é sem dúvida nenhuma uma das minhas ocupações predilectas. Só há mesmo uma coisa que eu gosto mais do que acampar: Dormir numa cama. Sim, porque tirando dormir numa cama, haverá coisa melhor que o contacto com a natureza, onde a toda a hora passarinhos nos bombardeiam com os seus pequenos e divertidos cocos? Haverá maior ligação ecologista do aquela em que podemos partilhar a nossa tenda com uma infinidade de insectos voadores e rastejantes, muitos deles que nem sequer sabíamos que existiam? Onde podemos até acordar a meio da noite com uma singela aranha na garganta, tão somente a asfixiar-nos?
Eu já acampei tanto. Sei tudo sobre o campismo. Só ainda não consegui compreender este estranho conceito tão caro ao mais comum dos campistas: pagar para montarmos o nosso próprio quarto. Não acham tão engraçado termos que disponibilizar dinheiro a alguém, só para podermos dormir no chão? Ou para dormir em cima de um estreito e nada espesso colchão, que o software das nossas costas nem sequer reconhece? ou na melhor das hipóteses, tentar adormecer num daqueles colchões que temos de encher durante meia hora com uma bomba de dar ao pé?
Quando chego a um parque de campismo e faço a inscrição fico sempre com a nítida sensação que os empregados da recepção só podem fartar-se de rir à nossa custa. Será que isto só acontece comigo? Indicam-nos o nosso local mas no fundo é como se nos estivessem a dizer, “pronto, está tudo tratado, já pagaram, agora mãos à obra! Podem espetar estacas à vontade, estender toldos e preparem-se para uma noite que a vossa coluna vertebral não vai esquecer tão depressa! (Quem deve gostar muito dos campistas são os endireitas, os fisioterapeutas e todos os massagistas em geral).
Bom, há outro tipo de campismo que eu conheço muito bem e onde não se paga: falo de acampar nos festivais de Verão. Esses têm realmente essa desvantagem. É que como não se paga, digamos que aquilo faz lembrar um pouco o metro de Tóquio em hora de ponta. Eu já acampei em terra batida, relva, tartan, areia, calhau mas só quando acampei pela primeira vez num festival de Verão, soube o que era verdadeiramente acampar numa trincheira. Isto num ano em que cheguei de noite. No ano a seguir cheguei de dia mas já estava tudo cheio por isso, fui forçado a dormir a um metro de um pequeno ribeiro, que não era mais o leito da água espumosa que vinha dos chuveiros. Um ano depois, tive que andar com uma catana a desbravar mato. Mas a partir daí aprendi a minha lição! Agora vou sempre com uma semana de antecedência.
Reparem, todos deviam acampar pelo menos uma vez na vida num festival de Verão. Um acampamento de festival é uma visão bela e indescritível que alarga os horizontes a qualquer um. Digo-vos: Não sabe o que é viver, quem nunca esteve num daqueles aglomerado de tendas que são autênticos colonatos do legalized, a que eu chamo carinhosamente de Faixa de Ganza. (E aqui se explica também porque é que a maior parte desta gente não se preocupa com o estado das suas costas, da sua roupa, do seu cabelo ou como aconteceu com amigo meu, de ir urinar de noite e ser acordado de manhã por estar no meio de dois indivíduos com péssimo hálito e que diziam a rir que aquela tenda não era a sua).
Não se deixem enganar, acampar nos festivais de verão é uma das experiências mais interessantes e enriquecedora que se pode ter na vida. Em que outro local as instalações sanitárias são uma cabine fechada, com um metro quadrado de diâmetro e um buraco no meio? Em que outro local a minúscula casa de banho do vosso apartamento de repente lhes parece o Palácio de Buckingham? Em que outro local terão a oportunidade de socializar e conhecer pessoas novas numa interminável fila, de manhã, porque só há um lavatório? Em que outro local se pode lavar os dentes no mesmo local onde outros lavam a loiça, removem a remela dos olhos, fazem a barba ou passam por água a roupa interior?
Em conclusão, uma interminável lista de pequenos prazeres. E por falar em prazeres, tenho cá para mim que no fundo, no fundo, acampar não é mais que a arte de fazer sexo com o menor barulho possível.
Se pensarem bem, quando estão numa tenda em pleno acto sexual, muitas vezes não estão a mais de uns palmos de distância de outra tenda, em que apenas um fino tecido impermeável os separa, de uma outra tenda, com outro casal, que possivelmente está também a tentar ter sexo. Isto é uma imagem assustadora, eu sei. Ora, se você não é daqueles que gosta de exibir os seus gritinhos, gemidos, palmadinhas e toda uma ritmada série de chloc-chloc-chochs (1), ter sexo numa tenda, que não em silêncio, é bem capaz de ser das coisas mais promiscuas que você vai fazer durante toda a sua vida.
Ou seja: De que é que vocês estão à espera para ir acampar?
(1) Espero que esta minha onomatopeia tenha sido suficientemente esclarecedora e expressiva.