Era suposto estar na Despedida de Solteiro de um amigo. Como é óbvio, não fui.
Venho antes, desmistificar de uma vez, as Despedidas de Solteiro. Ao contrário do que alguns homens e muitas mulheres pensam, as despedidas de solteiro não são um mero grupo de homens que se juntam uns dias antes do casamento para recitar poesia, ir à opera ou fazer potes em barro.
Nada disso, as Despedidas de Solteiro são um complexo e intrincado ritual colectivo de passagem que eu, com grande esforço, vou tentar resumir em três palavras: ver gajas nuas.
Este núcleo de homens que constitui a Despedida de Solteiro, e que apenas aparenta ser homogéneo, é na verdade, composto por diversos elementos com papeis sociais distintos e bem definidos. A saber:
O Noivo. Indivíduo que desistiu de ser feliz; Homem resignado, com anel no dedo, que se rende incondicionalmente a tudo o que os amigos propuserem para essa noite, como forma inconsciente de pedir desculpas por também ele ter cedido aos impulsos suicidas e anti-naturais do casamento. E porque também não lhe adiantava de nada tentar escapar-se.
O Padrinho do Noivo. Ao padrinho do noivo, caberá a espinhosa e exaustiva tarefa de avaliar e fazer o reconhecimento de todas as boîtes e casas de strip, num raio de – digamos - 30 quilómetros. É um trabalho difícil mas alguém te de o fazer. Numa primeira fase, o objectivo é encontrar o clube nocturno dotado mas melhores e mais robustas brasileiras e/ou strippers de leste. Depois, e muito mais importante que isso, o Padrinho do Noivo, tem a especial missão de descobrir aquela que será a dançarina perfeita, capaz de realizar a inesquecível Table dance (*) em exclusivo para o noivo em questão, enquanto todos os outros assistem.
(*) Table dance – Nome cientifico atribuído à dança erótica, executada por um transpirado e portentoso par de mamas e um rabo de outro mundo, pago pelos amigos para: ulular, ziguezaguear com sensualidade e passar tangentes ao nariz do Noivo, enquanto este permanece sentado, petrificado, imóvel, de olhos esbugalhados, agoniado e bêbado que nem um perú.
Amigos Que Não Bebem.
Também conhecidos por Motoristas; Espécie de amigos em extinção e que nas Despedidas de Solteiro gozam de grande simpatia e muita consideração junto dos seus pares.
Amigos Solteiros Que Já Não Tem Uma Namorada há Uma Carrada de Anos.
Em todas as Despedidas de Solteiro existe pelo menos um exemplar destes. É matemático. São por norma reservados, tímidos e prestáveis. Alinham (a medo) em tudo o que se propõe na Despedida de Solteira e participam com entusiasmo (contido), sobretudo porque têm alguma curiosidade latente em relembrar como é mesmo ver uma mulher nua em 3D.
Amigos Casados do Noivo.
Estes sim, são o verdadeiro problema dentro da Despedida de Solteiro. São eles os instigadores e os impulsionadores de todo o processo que leva à efectiva visualização de gajas nuas. Eu sou solidário com o papel do Noivo na Despedida de Solteiro, afinal de contas, estamos a falar de uma pessoa que, de livre e espontânea vontade, escolheu partilhar a sua vida apenas com uma mulher. Isto significa que se o casamento correr pelo melhor como se espera, o Noivo não voltará a ver outra mulher nua ao vivo, nos próximos 50 anos. E eu até sei que há homens que ao casarem, têm a secreta esperança de passar o resto da vida com essa mesma mulher. Dia após dia a vê-la envelhecer ao seu lado, a ficar com o corpo cheio de rugas, de estrias, de banhas, pregas de gordura, pele e carne flácida e muitas, mas mesmo muitas, varizes nas pernas. E isto é bonito. Mas é só no início. Os Amigos Casados do Noivo, aprenderam já que a vida não é só poesia e por isso mesmo sabem que têm uma, e apenas uma hipótese remota, de ver gajas nuas. Quando? Quando os amigos casam. E eles vivem para esses dias. Sonham com essas noites.
Claro que podem sempre ir a bares de strip noutras alturas, com outros grupos, como o grupo do Jantar da Empresa ou a Sociedade do Totoloto mas nenhum tem a força e a desculpabilização moral da Despedida de Solteiro. Em nenhum outro é permitido ir tão longe, ainda por cima com o conhecimento da esposa e poder dizer com toda a impunidade quando se chega a casa, “Eu não tive culpa. Os outros foram, eu não ia negar-me.”
Outros.
Por exemplo, eu. Sem papel nem interesse nenhum na Despedida de Solteiro. Assim sendo, tive que declinar o convite porque não estou para isso. Era o que mais me faltava. Se calhar perdi um amigo, mas como ninguém me entende, tive de arranjar uma desculpa esfarrapada e disse-lhe algo do género, “Ah, desculpa mas não vou poder ir à tua despedida de solteiro porque farto de ver gajas nuas ando eu, pá.”
Ele disse que compreendia mas imagino que não compreenda. Só espero que um dia me possa perdoar. Quanto mais não seja quando o convidar para meu padrinho de casamento.