Os telemóveis são um flagelo social. Já não há dúvidas. Chegámos a um ponto em que ter telemóvel é como ter Bilhete de Identidade: quem não tem, simplesmente não existe. Qualquer dia, um polícia manda-nos parar o carro e pergunta:
- Boa tarde, os seus documentos, por favor. - Ó senhor guarda, esqueci-me deles em casa. - Esqueceu-se? E telemóvel, tem? - Tenho sim, senhor guarda. - Muito bem, ao menos isso. Importa-se de mo mostrar?
Um tipo aí é que vai ficar mesmo nervoso.
- Aqui está, senhor guarda, veja. - Então este é que é o seu telemóvel? Nunca experimentou outro com certeza! - Eu sei que já está um bocado velho e... e tem o ecrã riscado, mas tem funcionado muito bem, senhor guarda. - Isso é o que todos dizem. Bom, desta vez pode seguir, mas recomendo que arranje um com toques polifónicos rapidamente. Tenho uma boa tarde.
Sons polifónicos? Mas afinal o que é isso? Há uma nova espécie de cultura, que leva as pessoas a julgarem que são tanto mais instruídas e eruditas, quanto mais informações inúteis sobre telemóveis souberem. Está toda a gente sempre à espreita de uma oportunidade para desbobinar todo o conhecimento adquirido:
- E já agora porque é que não arranjas um telemóvel com som EFR, dual-band, claro, ligações rápidas WCDMA, GPRS, UMTS, WAP, MMS, 3G e EDGE, bluetooth e mais uma catrefada de iniciais que ninguém sabe o que querem dizer? Importam-se de arranjar um dicionário para todas as mariquices que vão inventando para os telemóveis?
Dá vontade de berrar:
- EU GOSTAVA DE COMPRAR UM TELEMÓVEL QUE DESSE PARA RECEBER E FAZER CHAMADAS, CONSEGUE-SE ARRANJAR, NÃO?
Ainda bem que o novo código da estrada proíbe a utilização do telemóvel enquanto se conduz. Finalmente perceberam que é um perigo conduzir e falar ao telemóvel ao mesmo tempo. Sim, nunca se sabe quando é que uma pessoa tem de fazer uma travagem brusca, o telemóvel nos salta da mão, bate contra alguma coisa e arriscado até a partir-se ou a estragar-se, sei lá.
Quem aprendeu bem depressa a lição foram as mulheres. Já alguém viu uma mulher a falar ao telemóvel e a conduzir ao mesmo tempo? Nunca! Se disser o contrário é calúnia! Bem… só se for mesmo um caso de vida ou de morte, algo mesmo MUITO urgente. Tipo: ”Tou? Rosarinho! Olhe querida, tou super atrasada, pode marcar-me a manicura para daqui a duas horas? Obrigado querida! Você é um amor.” Ou então mais importante ainda, informação inadiável: “Lena, fofa, tu não vais acreditar nos sapatos que eu comprei hoje! Uma loucura. E os saldos? Tu já viste os saldos este ano...?”
Mas o que está mesmo na moda são as mensagens escritas. Ninguém parece conseguir sobreviver sem enviar mensagens escritas. Isso é que é mesmo impensável. Por exemplo, um casal de namorados combina encontrar-se num café. Um tipo vê a namorada a estacionar o carro e tem logo de mandar uma mensagem escrita. Não consegue resistir: JÁ TOU NO CAFE E TOU A VER-TE. BJS GORDOS (estou com franzir o sobrolho, como não poderia deixar de ser). A namorada acha piada e responde: FOFO É TÃO BOM K M TEJAS A VER. ENCONTRAMO-NOS AI DENTRO. XI CORAÇÃO. Ao que ele responde com outra mensagem: OK. Ele responde com OK! (podem por certo imaginar neste momento o meu olhar reprovador) Paga-se vinte cêntimos por duas letras! Ela está ali! Vai entrar no café dentro de 3 segundos! É um O e um K, por favor! Mas ainda há quem chame a isto escrita inteligente! Só ser for escrita da parte de quem digita OK e inteligente da parte das operadoras de telemóveis que ganham uma pipa de massa com esta brincadeira.
Mas ainda há pachorra para telemóveis? Quem é que raio vai de uma vez por todas livrar-se do... Hã, peço desculpa mas… mas tenho mesmo de atender esta chamada. É só um segundo. Sim, querida. Não, estou a meio dum post. Sim… sim… Ó querida, já sabes que eu adoro brócolos, por mim está tudo bem. Ervilhas? Ervilhas também são muito boas... são... verdes... pois. Falamos depois, pode ser? Pronto, beijinhos… gordos…